Foi numa sexta feira em abril que resolvi sair de casa mais cedo do que o normal para assistir a palestra que Nadine Chahine faria sobre tipografia arábica no Creative Mornings Berlin. Sempre que posso, acabo visitando essa ótima série gratuita de palestras sobre design e nessa sexta feira não foi diferente.
Mas, nessa vez, eu estava empolgado. Havia pesquisado o trabalho de Nadine Chahine previamente e sabia que era misturava dois grandes interesses meus: tipografia e árabe. E tudo que ela mencionou na sua breve conversa vai aparecer logo após o vídeo da palestra abaixo.
Antes de tudo, quem é Nadine Chahine?
Nadine Chahine é uma designer de origem libanesa que trabalha com tipografia na Monotype, onde ela é especialista em tipografia arábica. Foi lá que ela acabou adaptando algumas famosas famílias tipográficas para o árabe. Entre elas estão a Frutiger, a Neue Helvetica e a Palatino. Na palestra que ela deu no Creative Mornings Berlin, ela falou sobre o processo de adaptação da Zapfino para o árabe e todas as dificuldades que vieram junto.
Trabalhar com a Zapfino parecia uma piada já que a fonte é complicada demais para ser levada a sério em árabe. Mas foi isso que a Nadine Chahine resolveu fazer logo após concluir seus estudos sobre legibilidade tipográfica, focada nas linhas das fontes arábicas. Foi assim que a ideia de adaptar a Zapfino passou a se tornar viável.
E, no verão de 2012, ela passou a trabalhar na adaptação da Zapfino para o árabe. O processo começou de forma simples. Ela desenhava alguns dos caracteres no computador, imprimia algumas cópias desses elementos e levava para que o professor Hermann Zapf desse uma olhada. Como a Zapfino é uma fonte criada a partir da forma com a qual professor Hermann Zapf escreve cursivamente, não seria possível adaptar a fonte sem a aprovação dele.
O professor Hermann Zapf gostou da ideia e passou a ser visitado por Nadine Chahine pelos próximos dois anos. Ela desenhava alguns caracteres no computador e Hermann Zapf daria seu feedback logo depois. Foi assim que o processo de adaptação da Zapfino funcionou e todas as visitas eram acompanhadas de bolo de pêra feito pela esposa do Professor Zapf.
Adaptando a Zapfino para o Árabe
A forma com a qual Nadine Chahine adapta fontes do latim para o árabe é sempre bem pragmática. Ela sempre começa observando e analisando qual é a intenção e a função original da fonte e como adaptar tudo isso para o árabe sem perder a essência da mesma. É impossível copiar o estilo das fontes latinas e implementar nas fontes arábicas. Isso acontece por que o árabe tem uma direção diferente de escrita e uma forma bem pessoal de usar do estilo das letras pra reforçar a palavra.
O primeiro desafio que a Nadine Chahine teve foi como fazer a curvatura da Zapfino sem perder a essência da fonte. Isso se tornou um problema por que o árabe segue uma direção de escrita e o latim, segue outra. Se a versão árabe da Zapfino seguisse para uma direção diferente da sua versão em latim, elas perderiam o visual homogêneo que é esperado de uma adaptação como essa. Foi assim que Nadine Chahine acabou desenvolvendo um estilo caligráfico ao mesmo tempo.
Outro problema foi o de definir como seria a proporção dos ascendentes e dos descendentes. Quão longo eles poderiam ser na Zapfino Árabe antes de que eles cheguem a tamanhos ridículos e não aceitáveis? Afinal, esse é um elemento importante da tipografia em árabe e essa fonte não poderia ser uma piada e precisava ser levada a sério.
Outro grande desafio dessa adaptação foi criar as formas das letras separadamente e tentar passar a impressão de que todas as formas foram feitas ao mesmo tempo e na mesma linha. Em árabe, existem muitas formas diferentes de conectar as letras e o contexto das palavras pode mudar dependendo da forma com a qual elas foram escritas. Por isso que esse elemento se tornou tão importante.
No final, Nadine Chahine acabou criando cerca de 600 caracteres que podem ser conectar de até 20 formas diferentes. Tudo isso foi possível devido a existência de softwares como o Glyphs. A lógica por trás das conexões seria impossível de ser produzida se não fosse a tecnologia desse software.
Nadine Chahine diz que a adaptação da Zapfino para o Árabe foi um dos projetos mais difíceis que ela já fez e, por isso, ela acabou apelidando o projeto de Monte Everest. Ainda bem que deu tudo certo no final e hoje temos mais uma belíssima fonte a ser usada em árabe.
Se você ficou interessado em saber mais sobre a versão árabe da Zapfino, dê uma passada no site da Monotype. A fonte custa um pouco mais de 200 EUR e pode ser adquirida direto no site.
Dá para ler um pouco mais sobre essa fonte no I Love Typography , no blog da Linotype e na Fast Company. E dá para ler sobre a palestra, em inglês, direto no blog do Creative Mornings Berlin.
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